Mudar o Mundo? Será Possível?
Posso estar equivocado, mas creio que todo indivíduo minimamente idealista sonhou um dia poder mudar o mundo (para melhor, é claro), em algum aspecto ou perspectiva. Dita inspiração pode manifestar-se por diferentes canais de expressão. Pode materializar-se pela ação revolucionária apoiada por alguma causa ideológica, por uma ajuda material a determinada entidade filantrópica, por uma viajem a algum país menos privilegiado economicamente para tratar de almas desesperadas, ou mesmo simplesmente pelo exercício eticamente incorruptível, correto e exemplar de uma profissão. Na verdade, a forma de manifestar tal idealismo varia de indivíduo para indivíduo, e seus métodos podem ser dos mais amorosos aos mais violentos, dependendo de quem o esteja manifestando e de como escolher manifestar-se.
Porém, é comum observar que tais esforços idealistas, mais cedo ou mais tarde, acabam se arrefecendo, e vão perdendo o ímpeto, fatigados pelo constante ato de pisar no chão duro e frio da realidade. O intento da revolução ideológica não erradica o sofrimento (geralmente apenas o exacerba), a ajuda humanitária não elimina a miséria, o exemplo ético não encontra os esperados ecos ou aplausos. E então, a desilusão e a frustração invadem nosso peito e abandonamos a luta, certos de que o mundo não tem solução e só nos resta entregar os pontos.
Gostaria, no entanto, de propor uma abordagem alternativa para este impulso tão nobre de melhorar o mundo, abordagem esta que não necessariamente depende da existência de um idealismo mais exacerbado. Na verdade, trata-se de um acercamento bastante mais simples, e que, se aplicado pela maioria das pessoas, certamente reformaria nossa realidade. Trata-se do conceito de mudar o mundo tangível.
No meu livro Flores na Varanda, abordei brevemente este conceito no texto “Fazendo a Diferença”, e aqui o revisito, buscando fazê-lo algo mais prático e conectando-o com outro conceito, este um pouco mais elevado espiritualmente, que é o do amor ao próximo, mandamento emblemático do “Homem de Nazareth”.
Aquilo que podemos chamar de “nosso mundo” se demarca por nossas diversas zonas de influência, das quais podemos citar como o mais comum ponto de partida, nossos lares e nossas famílias. Logo em seguida, expandimos este perímetro a nossas amizades, nossas escolas, nossos ambientes laborais, nossas agremiações, até que finalmente nossa influência vai se tornando mais rarefeita, limitando-se a aqueles encontros esporádicos com contatos profissionais mais ocasionais e interações aleatórias com desconhecidos pelas ruas e centros comerciais.
Esse é o nosso mundo tangível, no qual, dia após dia, interagimos com os seres a nossa volta, e onde se renovam as oportunidades de influenciar positivamente tal limitado universo. É este mundo que nos cabe mudar, e o fazemos diariamente, seja de uma maneira consciente ou inconsciente. E é neste particular que a invocação de amar ao próximo fará toda a diferença.
Tempos atrás escutei uma frase que me fez ressignificar estas relações diárias, elevando-as a um novo e ainda mais significativo patamar. No caminho entre eu e Deus, está o próximo. Em outras palavras, o que essa poderosa frase sugere é que meu caminho para chegar a Deus são as minhas interações com meu próximo, seja ele quem for. E ao aplicar o exercício do amor em cada uma desta relações, não só me aproximo de Deus, como também provoco neste meu mundo tangível, uma verdadeira revolução, modificando-o um pouco a cada dia. Vejamos alguns exemplos.
No círculo familiar é onde geralmente as limitações individuais mais se evidenciam, já que despidos de nossas máscaras sociais, nossos egoísmos e impaciências mais cruamente se manifestam. Porém, se nos munirmos de um mínimo de intencionalidade, podemos aplicar a cada uma das relações aí envolvidas, o uso da indulgencia, da caridade e do perdão, componentes indispensáveis para um lar saudável e amoroso. Se o cônjuge passa por um momento de nervosismo, busquemos ser pacientes e ajudar de alguma forma. Se os filhos atravessam momento difícil de sua transição para o mundo adulto, busquemos orientar, dialogar, e por que não, disciplinar amorosamente quando necessário. É no seio da família que nossos maiores desafios amorosos se apresentam, mas será aí também, onde mais diferença faremos em nosso mundo tangível. Um diferença que, através dos filhos, poderá durar por anos, sobrevivendo nossa existência.
A intencionalidade também será requerida quando analisamos nossa influência positiva nos círculos mais expandidos das amizades, das vizinhanças, das agremiações e ambientes laborais. Lidamos com almas carentes, inseguras e aflitas todos os dias, e nossa atitude amorosa será demandada constantemente, seja através do exercício da compreensão, da empatia, do ouvido amigo e da tolerância das limitações alheias. Somos todos seres imperfeitos, e a aplicação do amor ao próximo nestas interações diárias poderá ter efeito sanador, não só nas relações, mas também no âmago de cada ser humano que nos cerca, elevando nosso mundo tangível a um patamar mais elevado de contentamento.
Finalmente nos sobram os contatos inesperados do dia a dia, com aqueles que cruzam nosso caminho de forma eventual, mas que também poderão se beneficiar de um sorriso, uma saudação afetuosa, de um trato mais humano.
O mundo tangível é a nossa área de influência. É o “nosso” mundo. E Fazê-lo melhor é um exercício diário, que jamais deixará de ser nossa responsabilidade, única, individual e intransferível. Não é uma questão de ideologia. É uma questão de responsabilidade amorosa, determinada pelo “Mestre dos Mestres” em forma de mandamento a quase dois mil anos. Nos resta obedecer e aplicar.