Fazendo por Merecer

Pouco tempo atrás, assisti a um vídeo que me fez olhar de forma diferente para os meus antepassados. Nele, o ator Nelson Freitas questionava se já havíamos parado para pensar nas milhares de pessoas que precisaram ter seus destinos cruzados, que tiveram que se apaixonar e/ou se juntar, fruto do amor ou da necessidade, para que então um dia fossemos gerados.

A conta ia mais ou menos assim; para chegar ao meu nascimento foram necessários dois pais, quatro avós, oito bisavós, dezesseis trisavós, trinta e dois tetravós, sessenta e quatro penta-avós, cento e vinte e oito hexa-avós, duzentos e cinquenta e seis hepta-avós, quinhentos e dose octo-avós e daí em diante. A partir deste ponto, já contabilizaríamos mais de mil pessoas envolvidas e centenas de casais formados, seja pelo amor ou pela conveniência da união de famílias (coisa comum em um passado não muito distante).

Apenas nessa conta rápida estamos falando em nove gerações para se chegar até mim. Possivelmente mais de duzentos anos de ancestralidade. Quem seria toda esta gente? De onde teriam vindo?

Como muitos de vocês já sabem, explorei um pouco da história de minha ancestralidade italiana em meu livro “A Mais Bela Travessia”, mas essa é somente uma pequena parte de minha hereditariedade, já que a análise do meu DNA apontou para “apenas” 50% de herança italiana (ou quase isso). Todo o resto está dividido entre franceses, espanhóis, portugueses, bascos (acredita?) e até irlandeses. A diversidade (apesar de ser totalmente eurocêntrica) é imensa, e fico imaginando as incríveis obras do destino para viabilizar a união de pessoas de terras distantes e idiomas estranhos entre si.

Imaginem quantos dramas, quantas dificuldades, quantas aventuras, e quantas lágrimas verteram pelo nascimento de bebês que um dia viriam a gerar outros bebês, até chegar a mim. 

E a mensagem principal do vídeo era extremamente profunda. Essa incrível multidão passou por poucas e boas para chegar à minha existência e, portanto, devo fazer o que estiver ao meu alcance para merecê-la. Viver a vida intensamente, de forma apaixonada, sem dramalhões e queixas inúteis. Que conceito mais inspirador. Devemos merecer quem nos precedeu e tornou viável a nosso existência. Fantástico!

Mas a este conceito eu gostaria de adicionar uma outra perspectiva. Quem é da minha idade, um pouco mais novo ou um pouco mais velho, deve lembrar-se do cantor e compositor mineiro de MPB Beto Guedes, que escreveu canções maravilhosas, altamente idealistas e inspiradoras. Para mim, sua melhor canção chama-se “O Sal da Terra”, onde Beto nos convida a “recriar o paraíso agora, para merecer quem vem depois”. Escuto essa canção a quase quarenta anos e até hoje essa frase me impacta profundamente, pois coloca em cada um de nós a responsabilidade de construir um mundo e uma sociedade que não será apenas para nós, mas principalmente para quem nos sucede, para quem ainda está por vir, para nossos filhos, netos, bisnetos, etc, etc, etc. Ou seja, para os outros milhares de seres humanos e centenas de casais que ainda estão por se formar nos próximos séculos, fruto de nossa hereditariedade.

E aí pergunto, que mundo estamos deixando para nossos descendentes? Se imaginarmos o planeta em que nosso tetravô viveu e compararmos com o que vamos deixar para o nosso tetraneto, como nos sentimos?  Como estamos nos posicionando em relação ao materialismo exacerbado, a deterioração dos valores morais, a ausência de generosidade nos gestos do dia a dia, a decadência no cuidado com a família?

Mas o melhor, Beto Guedes deixa para o final. Ele pede para que deixemos nascer o amor, deixemos fluir o amor, deixemos crescer o amor,  deixemos viver o amor.

E não é esse o “segredo” que nos foi confiado há 2000 anos, lá na Judéia?

Pois é meus caros. Aparentemente Jesus Cristo nos deu o mapa, e ainda assim, conseguimos nos perder. Sem a caridade (em todas as suas múltiplas formas) e amor ao próximo (todos os possíveis próximos, como elaborado no post anterior), será bastante difícil merecer quem veio antes, e muito menos quem está por vir.

Hoje deixo a vocês o convite para que revisemos nossas práticas, vivendo intensamente como forma de honrar os milhares de antepassados que viabilizaram nossa existência, mas que também assumamos a responsabilidade de melhorar o mundo para nossos herdeiros planetários. E isso não acontecerá por acaso. Requer um mínimo de firmeza de propósito e de intencionalidade.

Afinal, construir um mundo melhor para quem ainda está por vir, também é uma forma de amor ao próximo e de caridade. É amor e caridade que transcende o tempo.

Assistam abaixo ao vídeo e à canção que foram mencionados no texto.

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